19.4.11

neruda: prefácio de "confesso que vivi" - livro de memórias

"estas memórias ou lembranças são intermitentes e, por momentos, me escapam porque a vida é exatamente assim. a intermitência do sonho nos permite suportar os dias de trabalho.
muitas das minhas lembranças se toldaram ao evocá-las, viraram pó como um cristal irremediavelmente ferido.
as memórias do memorialista não são as memórias do poeta. aquele viveu talvez menos, porém fotografou muito mais e nos diverte com a perfeição dos detalhes; este nos entrega uma galeria de fantasmas sacudidos pelo fogo e a sombra de sua época.
talvez não tenha vivido em mim mesmo, talvez tenha vivido a vida dos outros. 
do que deixei escrito nessas páginas se desprenderão sempre  - como nos arvoredos de outono e como no tempo das vinhas - as folhas amarelas que vão morrer e as uvas que reviverão no vinho sagrado. 
minha vida é uma vida feita de todas as vidas: as vidas do poeta."

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