18.12.09

o primeiro.


meu amigo se casou.
meu melhor amigo se casou.
fui madrinha, e o nosso outro melhor amigo entrou comigo.

nervosismo, ansiedade e a porta se abriu.
luzes, flores, cores.
convidados emocionados, convidados entediados, convidadas fofoqueiras.
música, músicos.
ele, lá na frente, em pé, sozinho.
e quando o olhar dos 3 se cruzou, foram 6 olhos marejados e 3 cabeças com o pensamento lá na infância, na escola de botafogo, no rio de janeiro do início dos anos noventa, nas aulas de piano, na amizade infantil que sempre tangeava terrenos amorosos, nas brincadeiras de casinha, nas brigas, nas (já) composições infantis, no IAP que nos juntou novamente, nos (raríssimos) estudos, nas aulas de violão, nas conversas conversadas por olhares, na cumplicidade agora amadurecida intacta por tanto tempo e acima de tudo, na amizade que nos fez irmãos, de sangue mesmo...

quando a gente é criança, não sabe quem vai e quem fica. por sorte, ou por bênção, esses dois ficaram. e naquela hora, éramos 2 e não mais 3. naquela hora, naquela entrada, nós víamos nosso amigo crescer; e com um enorme sorriso no rosto, seguir seu caminho, sem medo...naquela hora, já tinhamos saudade de tudo e os risos misturados `as lágrimas eram mera aprovação, orgulho, exasperação; tudo tão misturado que não saberia explicar..

e choramos. e nos alegramos.
os nossos sorrisos são espelhados no dele.
se ele sorri hoje, nós também sorrimos.

depois de tanta festança, eu sai com o orgulho de saber que amizades assim existem além da ficção. saí desejando que esse sorriso dele seja eterno e dure até quando eu mesma não puder mais sorrir...

e ele foi apenas o primero....

comprei.

17.12.09

dicas

o site da tv cultura é bastate rico..
pra quem tem interesse, entre em www.tvcultura.com.br .....
vários programas interessantes, como por exemplo, o programa "clássicos", que passa todas as 3ªs , as 23:00, e reprisa toda quinta-feira...
to adorando......pq daqui a pouco, vai começar o reprise de um recital do nelson....rsrs!...

outra coisa legal é o site www.medici.tv ....
só que nesse, só dá pra assistir parte dos vídeos. se quiser assisti-los na íntegra, tem que pagar.....mas mesmo assim, tem coisa ali que vale a pena......vídeos de intrumentistas diversos, concertos famosos, documentários sobre regentes, intérpretes e compositores......vale a pena.....

serve pras horas de "ócio construtivo" (pra quem não é músico)....e pras horas de estudo (pra quem é....)

enjoy.

11.12.09

cantinhos


é tão bom quando descobrimos pequenos cantinhos nas metrópoles. cantinhos que são únicos, que só existem ali. na imensidão urbana, quem descobre um desses sente-se herói por saber da existência de um lugar tão singular e tão oculto.

fui a um centro cultural segunda passada. chovia e chovia. assisti um concerto. eu e dois amigos. é bom ouvir música sendo bem feita na companhia de músicos; todos sentem e reagem juntos a detalhes que facilmente passariam despercebidos. o pequeno auditório ficava dentro deste centro.
depois de alimentar minha alma com tanta criatividade e bom gosto musical, resolvi "explorar" o centro cultural. avistei uma porta de vidro, e o ambiente lá dentro me chamou a atenção: habitado por várias pessoas de aparência peculiar, muitos quadros, tintas abertas e borrões por todos os cantos. duas camas bagunçadas. cada um fazendo uma atividade diferente, todos com fone de ouvido. uma cozinha. não havia paredes, divisórias, nada. e sozinho, bem na entrada, concentradíssimo, eu encontrei esse pintor. pintava calmamente. parecia que pintava no rítmo da música que tocava em seus fones de ouvido. eu assistia interessada. um minuto depois, ele se distanciou do quadro, e sentou a uns 3 metros de distância. olhava, olhava. lançava olhares tortos, duvidosos para sua obra. estava tão absorto em sua arte, que não percebeu minha presença.
e eu olhava pra ele, olhava para o quadro. e num silêncio quase reverente não conseguia conter minha alegria por estar testemunhando aquele momento único.
o artista concebendo a arte. fazendo ali, na minha frente....

entrei no carro, e ainda chovia......
e voltei pensando.
ainda bem que existe arte.
ainda bem que sou artista.
ainda bem que existem artistas por ai, espalhados, em cantinhos nunca imaginados, mas que compreendem essas minúcias e lançam sua alma em cada manifestação artística, nem que seja para ninguém ver.

porque a arte por si só já basta.

1.12.09

:)


sou a mais nova assinante da temporada OSESP 2010!...
inclui 9 concertos durante todo o ano, tem desconto de estudante, e o concerto de fechamento será o brahms piano concerto no. 2, e o solista será nelson freire.....
antes disso, otimos concertos com repertorio interessantissimo, tendo compositores como: Tchaikovsky, Rachmaninov, Debussy, Saint-Saëns, Ginastera, Berlioz, Dvorák, Schubert, Mahler (sinfonias...), Britten e tantos outros.....

IUPI!

(pra quem tiver interesse, www.osesp.art.br )

50 anos sem villa-lobos


no dia 17 de novembro, fez 50 anos que o Brasil perdeu um de seus maiores compositores.
sempre apreciei a obra de villa-lobos e esse gosto me foi legado por meu querido pai, que desde sempre tocou e ouviu villa-lobos; agora que comecei a estudar sistematicamente sua obra e a analisar seu estilo de composição, essa admiração só aumentou.
no repertório para piano, o mais impressionante é como ele usa elementos rítmicos tão característicamente brasileiros e é sobretudo, erudito.....

nesse contexto, eu recomendaria para audições preliminares o cd de anna stela chic ou o de nelson freire, tocando a prole do bebê. ambos os intérpretes tocam o mesmo repertório. mas ana foi quem abriu as portas da europa musical para nelson. os estilos de interpretação em nada se parecem, mas vale a pena comparar.

outro cd que vale a pena ouvir é "obrigado brazil", de yo-yo ma. neste, as músicas que foram originalmente escritas para piano têm transcrição para duos de cello e piano. mas as parcerias são perfeitas e é muito bacana ouvir a compreensão de yo-yo ma da música brasileira.....esse cd contém não só obras de villa-lobos, mas de camargo guarnieri e outros importantes compositores brasileiros. mas como o nosso assunto aqui é o villa, eu indicaria as faixas "a lenda do caboclo" e "alma brasileira"..

enjoy.

23.11.09

relatos silentes


os dias atuais tem sido comedidos. vivo entre silêncios e palavras ponderadas. os veríssimos, as brontë e os apóstolos tem sido companhia constante.
ando observando muitos as pessoas, as gentes. coisa curiosa.
voltava ontem de são paulo (novamente, e dessa vez sem apertos no metrô, sem calor sufocante e sem atrasos...). o trajeto até o terminal tietê foi tranquilo. Miraculosamente, pouco ou nenhum trânsito. é o que os paulistanos chamam de "bênção dos fins de feriado", resultando no contra fluxo no trânsito da cidade. Pobre de quem veio a sp. sorte de quem saiu, como eu.
cheguei com certa antecedência, comprei minha passagem (da viação bonna vita), e como me sobraria algum tempo, entrei clandestinamente na sala vip da viação cometa ( sei que esse meu ato não foi o mais honesto possível, mas se mais passageiros como eu repetirem o feito, a Cometa pode alertar-se para o fato de que a inclusão do destino "arthur nogueira" pode ser lucrativa) e por lá fiquei. eu e o veríssimo pai. entretidos e maravilhados. li "o prisioneiro". como gosto dessa escrita, dessas descrições.
uma olhadela no relógio me levou até a plataforma 28, e lá embarquei. ônibus cheio. do meu lado, uma menina de 12 anos. o nome, laura. "seu nome é laura? o meu também..." e ela me respondeu com um sorriso doce e quieto. senti que aquela troca de intimidades com uma estranha infante foi desnecessária segundos após esse breve diálogo. mas, ora! estava dito! voltei aos meus silêncios e ao meu veríssimo, que aguardava-me cheio de frases e palavras lindas.
o passageiro que assentava-se logo a minha frente possuía um celular extravagante, um fone inútil e provavelmente não conhecia as regras sociais dos ambientes públicos. ele ouvia algum forró. não contente com a própria satisfação, decidiu compartilhar com o resto dos passageiros essa experiência auditiva. tirou o fone, e aumentou o volume. o ônibus, outrora silente e pacífico, tornou-se praticamente uma estação de rádio. as pessoas se movimentavam e cochichavam, mas ninguém se pronunciava.
eu estou na minha fase silente. não queria ser a porta-voz dos outros 39 passageiros. esperei 2 minutos. ninguém se moveu. então o temperamento sobrepujou a situação. vesti a capa da voz suave e grave: "senhor, senhor! pode, por gentileza abaixar o volume?" e ele replicou com um irritante tom médio e invasivo: "quê?" antecedida por um profundo suspiro, repeti a sentença, agora na versão imperativa: "abaixe o volume." e ele concordou, silenciando o pobre cantor, que teve seu público diminuido para 1 ouvinte. pobre, pobre!
voltei ao meu veríssimo. depois recorri as minhas audições e felizmente, não compartilhei com o resto dos passageiros.....
cheguei em casa feliz, insipirada e falante. mas obrigatoriamente, esses meus dias precisam ser quietos.
então, silenciei.

14.11.09

seconde

eu amo essa arabeske...

ps: pra quem não está entendendo a razão da postagem desses vídeos, favor ler 2 posts abaixo..

premier

debussy, pra começar bem a semana.....


só a título de esclarecimento

uma tristeza profunda me invade toda vez que lembro que amanhã, dia 15 de novembro, em campinas, Nelson Freire dará um concerto com a sinfônica da cidade, e tocará o 2º concerto de Chopin...

só mesmo uma debilidade física para me impedir de estar presente...

e é o caso.

portanto, postarei coisas que me alentam o coração nessa hora triste.

5.11.09

dias paulistanos


são paulo. 35 graus centígrados. 17:30 hs. metrô.

desespero, tumulto, falta de ar, dor de cabeça, gente desconhecida E SUADA se enconstando, barras de ferro pegajosas, conversas alheias de norte a sul. o destino é ainda mais apavorante : terminal rodoviário tietê. 

ainda que eu não goste muito de redigir minhas estórias em primeira pessoa, terei de fazê-lo desta vez...não tem como.

A situação ficou ainda mais caótica quando o "trem" a nossa frente quebrou, provocando assim um "engarrafamento subterraneo". Ameacei ter um acesso de claustrofobia, mas minhas orações incessantes me trouxeram tranquilidade, ainda que meu estado psicológico estivesse bambo na linha tênue entre o desespero e a calma. Quando a parada foi "Sé", é que a desgraça se fez...andei pensando, mas não existe nada que eu possa fazer com as palavras que transmita verdadeiramente qual foi o meu desespero naquele momento.
Ao finalmente, desembarcar deste pesadelo, olhei para o relógio: 18:04 hs. Corri em direção ao balcão da "viação bonna vita", e perguntei que horas saía o próximo ônibus para Arthur Nogueira (a má vontade destes atendentes de balcão sempre me impressionou! Ora! Eu, recém chegada de uma visita ao inferno e eles todos envolvidos nas ternura fresca do ar condicionado...um pouco de presteza não faria mal..) Calmamente - acredite, com muitíssima calma - o atendente me informou que o ônibus que eu procurava partira havia exatos 4 minutos, lançando sobre mim um atrevido olhar de pena. 
Saí bufando, mas já sem muitas forças. A noite mal dormida me provocou intensas dores de cabeça durante o dia todo. E agora, ela só aumentava..
No balcão da "cometa", uma fila enorme...paciência, paciência, 123456789 10.........o próximo ônibus para Campinas partiria em 10 min. Nem pensei. Embarquei no ônibus e num sono pesado e profundo...
Não sei se sou sozinha nesta opinião, mas não tem nada mais deprimente do que ser acordada pelo motorista do ônibus, depois que todos os outros passageiros já desceram, já retiraram suas malas, e até uma nova fila de passageiros formou-se em frente ao ônibus. Todos prontos pra embarcar.....odeio, odeio!...mas aconteceu......
Saí correndo, a procura de um ônibus para arthur. Não tinha mais. somente circulares, e para Cosmópolis, a cidade que antecede arthur nogueira...
Mesmo assim, saí atordoada pelas ruas de Campinas. Noite quente, abafada, dia indescritivelmente cansativo. Parei no ponto de ônibus. Pedi informação. Estava no ponto errado. Saí a procura do novo ponto, e acertei. Felizmente, o ônibus ainda não havia passado. Quando finalmente chegou, ao subir as escadas, eu perguntei ao motorista se o ponto final era realmente a rodoviária de Cosmópolis, num tom desesperançoso. Ele respondeu com um sotaque inesquecivelmente interionano : " Não senhora. Este ônibus vai até Arthurrrr Nogueirrrrrra".....
Meu rosto se encheu de uma luz que até fê-lo assustar! Subitamente, todo o cansaço ficou para trás e eu sorria como se estivesse dentro do veículo que me levaria ao céu.

Liguei o ipod, e a música me embalou.Ah, se não fosse ela... Esqueci da dor nos pés, da mala a tira colo, da dor de cabeça, das pessoas grudentas que se encostavam, da falta de ar, do calor e até do sono...

Segui, e segui feliz!

Ah! Eis a cereja do bolo: o circular tinha ar condicionado.....rs.

2.11.09

hoje

não adianta reclamar, espernear...
a saudade é como uma mão cruel que aperta tudo que de vivo existe. 
e permanece. 
o jeito é conformar-se com a presença dessa dor aguda e esperar. 

ainda que seja doloroso viver nessa angústia, a lembrança dos dias que estão por vir serve como consolo sustentando um sorriso oscilante, frágil, mas genuíno.

...

30.10.09

sergipanas


Joana anda solitária por calçadas nordestinas. A tarde cai, e os raios estirados de sol avermelhado invadem o lado esquerdo da ruela e todos os seus adendos. Ela anda em contraste com os nativos. Tem passos apressados, curtos e precisos. 

A calmaria de Aracajú a impressiona a todo momento. As conversas são mais lentas, os fazeres, os dizeres, os abraços, os sorrisos e conseqüentemente, os passos. O ar é úmido e espesso e ela ainda lança mão de algum esforço para sorvê-lo. Os rostos que contempla são todos bronzeados, luminosos e marcados por umas experiências que Joana não descreve mas compreende. O falar é simples, arrastado, manso e incrivelmente alegre. As ruas de calçamento antigo abrigam prédios ainda anteriores ao pavimento, com paredes que aqui ou lá estão por ser refeitas, mas o esboço da arquitetura barroca é imutável. Ela se encanta. E a praia fluvial a contempla azul e sonora. 

É quase noite de domingo e Joana andarilha silente, sentindo uma placidez de alma que desde os tempos de infante não sentia. Pensa uns escritos que logo fogem a memória recente e em seguida pensa outros versos, que novamente se vão com a brisa morna da noite que chega. 

A vontade é pular no falso mar, molhar o corpo, bronzear a pele marcada e limpar os pensamentos antigos, velhos, guardados. Deixá-los lá; de vez e para sempre. Sentir o secar da água nos braços nus e fechar os olhos enquanto as últimas gotas escorrem pelo rosto impermeável. Sorrir um riso livre, cego , sem se preocupar com os expectadores. É desse banho que Joana precisa. E depois dessa breve contemplação e do encontro com o imaginário, Joana volta ás calçadas antigas, andando um andar barulhento, que ecoa na praça deserta.

A noite caiu. Os jardins parecem acordados e escondem os segredos da cidade velha. Assistem aos passos agora apressados. Ela tem um medo breve. Não absorve o que pensa e apenas corre. 

Avista o hotel.

E de volta ao quarto refrigerado, volta a realidade sulista, que definitivamente, não a instiga a pensar e a sentir. Não importa. Joana ainda tem cinco dias. Sergipe ainda tem muito a oferecê-la. 

E outros fins de tarde se repetirão.


Talvez o banho até aconteça.

irresistível


não sei se é esta uma fase poética; o que sei que os versos me encontram a todo instante.
e vinicius já ocupava minhas prateleiras douradas, mas somente nas páginas. agora, ele é felizmente visível.

o poeta que viveu a agonia de ser essencialmente erudito e popular ao mesmo tempo...

a arte desta obra me emociona toda vez que assisto.
apesar da função deste blog não ser a de fazer propagandas, eu abro mais esta exceção.

....

21.10.09

100 sonetos de amor


Ah, Neruda! "Sempre aprontando"... Num dia que já havia amanhecido azul, tive a alegria de me esbarrar com esta pérola numa leitura casual. Melhorou meu dia e precisei compartilhar...

ps: parece que o blogspot não é muito fã das publicações poéticas, então não obedece aos meus comandos de separação dos dois quartetos e dois tercetos, próprios do soneto. Dessa forma, eu peço desculpas pela gafe estética e peço que o leitor faça as devidas divisões estróficas ao ler......hehe.



-XVII-

No te amo como si fueras rosa de sal, topacio
o flecha de claveles que propagan el fuego:
te amo como se aman ciertas cosas oscuras,
secretamente, entre la sombra y el alma.
Te amo como la planta que no florece y lleva
dentro de sí, escondida, la luz de aquellas flores,
y gracias a tu amor vive oscuro en mi cuerpo
el apretado aroma que ascendió de la tierra.
Te amo sin saber cómo, ni cuándo, ni de dónde,
te amo directamente sin problemas ni orgullo:
así te amo porque no sé amar de otra manera,
sino así de este modo en que no soy ni eres,
tan cerca que tu mano sobre mi pecho es mía,
tan cerca que se cierran tus ojos con mi sueño.



...

15.10.09

--

e já dizia o querido j. drexler :" nada es más simple, no hay otra norma, nada se pierde, todo se transforma..."

13.10.09

"quase tudo"


o título desta postagem é também o título do livro que estou terminando de ler.
maravilhosamente escrito, é a autobiografia da grande pianista magdalena tagliaferro.
mais adiante, postarei um raro vídeo do 5º concerto de saint-saëns tocado por ela.

leitura que recomendo, e audição.........nem se fala.

12.10.09

uma página já basta


memórias da minha primeira visita a ilha de Paquetá, RJ, provavelmente aos 4 ou 5 anos de idade.


E um dia o pensamento resolveu visitar a ilha. Aquela ilha que já está com as páginas amareladas e umas orelhas rasgadas de tanto esforço pelo resgate da lembrança. E não adianta. Só aquela página permanece escrita. As outras, igualmente envelhecidas, não demonstram nenhum indício de tinta ou de carvão ou de qualquer outro sinal de registro escrito. O jeito foi revisitar a mesma e antiga página.

Número 14.

O interessante é que o pensamento já chega na ilha lá pela metade do dia. Desembarca do bote com as pernas cansadas, como se tivesse caminhado o dia todo, tirado uma porção de retratos, parado e apreciado o novo e agora, os olhos miram as lambujas, pois os andadores já gritam, latejando.

Foi aí que o pensamento encontrou a menina vestida de listras vermelhas e cachos negros domados por um laço de fita. A menina não se dá conta de que o pensamento a encontrou.

Anda com feição de desconforto. Parece que o cheiro das calçadas de pedra marítima não lhe agradam; não pelo fato de serem do mar, mas porque parece que algum turista desavisado esqueceu que um dia, um outro indivíduo de alma infinitamente mais nobre presenteou a humanidade com seu maior invento: o vaso sanitário.
Pois bem. O sujeito de espírito vergonhoso aparentemente não teve tempo de encontrar o caminho devido e fez das calçadas da ilha seu vaso sanitário particular. Aliás, provavelmente este não tenha sido o único. Ultimamente, a proliferação dessa espécie de fulanos tem sido assustadora.E naqueles dias, não era diferente.Daí a razão da testa atrofiada da menina das listras vermelhas, cujos olhos negros pronunciam todas as palavras de baixo calão que ela ainda nem aprendeu, mas que certamente já perambulam por suas veias de brasileira.

E o pensamento deu sorrisos largos ao reencontrar essa menina emburrada.
Foi tão grande seu deslumbramento que perdeu de vista os cachos saltitantes por entre os outros milhares de transeuntes apressados e ranzinzas. A multidão levou a inocente.

Sem saber exatamente por onde seguir seu trajeto, o pensamento ouviu o trote dos cavalos que moviam as charretes turísticas, ao ruidosamente cruzarem as alamedas da ilha.

A página vai acabando.

O pensamento, numa última tentativa, olha para essa charrete que diante dele passa. E vê os olhos da menina pela janela de plástico. Vê as listras vermelhas e o laço de fita envolvendo a cabeleira escura. E a menina, sem saber, o fitou.

Fecha o livro que tantas vezes folheara, entra no bote e volta para o continente.

Mais uma vez, esta página apenas bastou ao pensamento.

30.9.09

paciência


esse ano, resolvi me aventurar pelo universo dos intrumentos melódicos (universo para mim, até então desconhecido, porque sempre toquei instrumentos harmônicos....)
o som macio, gordo e envolvente do cello sempre me atraiu.
mas frustrante é saber que conseguir encontrar o "seu som" como instrumentista é uma arte que exige anos e anos e anos. e o pior é que eu tenho consciência do grau de dificuldade que um instrumento pode chegar..
de qualquer forma, ainda a passos curtos e tímidos, tocar cello tem desenvolvido minha sensibilidade de forma imensa.....
em julho, conheci uma ucraniana que é exímia cellista.....contei das minhas tristezas como pianista aspirante a cellista.....ela perguntou há quanto tempo  me dedicava ao estudo do instrumento, e após a minha resposta inocente (3 meses)...ela soltou uma gostosa gargalhada, e replicou : "vai precisar de paciência. para você COMEÇAR a gostar do seu som, é necessário no mínimo 3 anos"...

depois dessa declaração, me conformei... tudo tem um começo.

ultimamente


não há tempo de pensar, de escrever, de dormir.
os minutos escorrem pelos meus dedos e eu vivo sempre com uma angustiante sensação de urgência, de exasperação.
até as palavras me fugiram. tentei algumas vezes transcrever esses meus pensamentos, mas elas andam arredias, distantes...
o que sobra são as marcas das noites de pouco ou nenhum sono e o corpo cansado, que ainda acompanha o rítmo dos intermináveis compromissos como objeto inerte levado pela correnteza que o rio bravio carrega.
o momento em que finalmente me deito e suspiro de exaustão me lembra que não posso fazer tudo o que gostaria e principalmente, não posso fazer tudo que todos querem de mim.

por isso, minhas desculpas pela ausência nos relatos...

semana que vem, espero respirar ares mais plácidos.

28.8.09

2 dias depois do post "aflição"..





depois de tanta aflição ( como pode-se notar no post anterior a este), eu consegui o ingresso para o concerto do Nelson Freire. a noite era ainda mais especial pois se tratava da inauguração de um piano Steinway Concert Grand - D, que acabara de chegar da cidade de Hamburgo, Alemanha, onde foi fabricado. Aliás, foi o Nelson quem alertou a organização da casa a necessidade de agregar a onda de renovações um piano a altura. 
Mas, como já antes mencionei, quem inauguraria este piano seria a pianista portuguesa Maria João Pires. Como ela adoeceu, Nelson foi quem fez as honras.

E que honras! O programa foi:

Johann Sebastian Bach/Alexandrer Siloti - prelúdio para órgão em sol menor

Ludwig van Beethoven - sonata op.27 em dó sustenido menor "ao luar"
- adagio sostenuto
- allegretto
- presto agitato

Robert Schumann - papillons op.2

INTERVALO

Frederic Chopin - 2 noturnos op. 27 (n.1 em dó sustenido menor e n. 2 em ré bemol maior)
scherzo n. 1, op. 20 em si menor

Claude Debussy - 4 prelúdios (livro n. 1)
les collines d'anacapri
- la fille aux cheveux de lin
- la danse de puck
- ministrels

Heitor Villa-Lobos - Alma Brasileira
         Dança do Índio Branco


*    *    *    *    *    *    *    *    *    *

como descobri sobre este concerto em cima da hora, não deu tempo de avisar amigos e combinar um "get together"...por isso, já peço desculpas! mas a noite foi musicalmente inesquecível.

nest post, vão algumas fotos da noite, e os próximos são auto-explicativos.

25.8.09

aflição


acabo de descobrir que Nelson Freire vai dar um concerto no Teatro Municipal de São Paulo na próxima quinta-feira, dia 27 de agosto. Ele substituirá a pianista Maria João Pires, que não poderá comparecer por motivo de doença.

Só faltam 2 dias. E a agonia de não conseguir saber se ainda tem ingresso, com a maravilhosa internet do unasp????


........

24.8.09

kolia


um dia ela vai ser minha, e vai se chamar kolia.

um trecho


de quando em quando, pretendo postar alguns trechos retirados dos meus livros favoritos. neste primeiro, a poética tradução da alma do músico:


Clarissa - Érico Veríssimo, pp. 50



Amaro deixa o piano. As frases que compôs não o satisfazem. Não importa. Amanhã talvez

lhe venha uma boa onda de inspiração. Amanhã...

Vai de novo até a janela. A lua já subiu. No pátio da casa vizinha o muro caiado, ainda mais branco sob o luar, projeta no chão uma sombra longa. O rio parece de mercúrio. Os montes, longe, dentro da noite clara, têm um tom irreal. No pátio dormem sombras misteriosas. O tanque de lavar roupa, transbordante d’água, prende em seu espelho líquido o disco da lua. E a lua treme e se parte em cacos na água que a brisa encrespa.

Amaro contempla a noite longamente.

E fica ouvindo , deliciado, uma música suavíssima que ele não sabe se vem de dentro dele próprio ou se desce da lua...

Positivamente, quem tem razão é o contador do banco: “ O senhor é um lunático”

(...)


19.8.09

chuva


choveu a noite inteira. 
como gosto de dormir ouvindo a chuva cair.
no meio da noite, acordei algumas vezes e lembro vagamente do som da chuva caindo.
voltei a dormir feliz.
acordei hoje pela manhã, e ainda chovia.
choveu o dia todo. 
e a noite chegou novamente, e a chuva ainda cai trazendo com ela um ventinho frio, fino.

apesar do dia estar cinzento, eu gosto.
gosto do ar úmido, e das poças no caminho.
sei que parece estranho, mas simplismente gosto.

agora vou dormir, e ela ainda cai...
isso é sinal de sono bom!

até.

13.8.09

bálsamo de hoje

depois de um dia em que nada deu certo, eu me deparo com uma dessas gratas surpresas que a gente tem de vez em quando na internet.

já sou ouvinte assídua deste concerto há alguns meses, e tenho a gravação dele com o trio baremboim+pearlman+yo-yo ma. nada mal. mas este vídeo, postado em um dos blogs de música erudita que costumo frequentar, traz o mesmo concerto sob a interpretação de martha argerich (piano) e os irmãos Capuçon, que eu não conhecia até hoje.
sublime, e inevitável a comparação com a gravação que estava acostumada a ouvir. na realidade, as estrelas da obra são o violino e o cello, e neste quesito, itzak pearlman e yo-yo ma são imbatíveis. a escrita para o piano já tem aquele caráter típico do período clássico, e com daniel baremboim me soa ainda mais mecânico. a genialidade da martha ( que é quem toca neste vídeo que estou postando) está em tirar o máximo de música de uma peça que pode facilmente soar como um engenhoso emaranhado de notas.
meu trecho preferido: a partir de 5:47 min.
ah!....e a obra é o concerto triplo de beethoven, op. 56 ....eu tenho vontade de mudar de profissão quando lembro que a criatura compôs esta pérola em sua terceira fase. Ou seja : já estava completamente surdo!!!!!


enjoy it.

4+1+1


não existe nada como a segurança das velhas amizades, a quem sou declaradamente devotada.
a dinâmica dos relacionamentos demanda manutenção e cuidado. e eu preciso melhorar tanto!
mas depois que o quarto ficou vazio, depois dos diferentes continentes, depois das viagens fracassadas, depois dos emails atrasados e principalmente, depois da cruel rotina da distância, essas três continuam no meu porta retrato preferido.

6.8.09

triste fim de rico


Hoje, ao papear com uma amiga, relembrei um antigo cabelereiro. A lembrança a princípio foi ruim. Mas com o desenrolar da conversa, acabei por sentir pena, uma tristezinha pontiaguda, e logo mais apontarei as razões.

Rico foi, algum dia, o responsável pela aparência da célebre Elis Regina. Seus dias áureos foram preenchidos com a exuberância, o vigor e o caráter temperamental da estrela. Tamanho foi o impacto da Elis na vida do Rico, que ele não conseguiu desgarrar-se dessas memórias mesmo tanto tempo depois da morte dela.


Conheci essa figura há uns 3 anos. Confesso que minhas impressões não foram nada positivas em nosso primeiro encontro. Pelo contrário. Lembro-me, sem esforço de memória, que logo ao entrar no salão, percebi que ele tentava lavar o chão, cometendo apenas o pecado de não varrer primeiro os cabelos cortados. A água com as madeixas formava uma pasta cabeluda e nojenta. Já torci o nariz. Interessante que essa imagem em nada combinava com a propaganda que me haviam feito do estabelecimento. Continuei a observar: a tonalidade geral era acinzentada, talvez por ser uma boa mistura da fumaça dos mil cigarros que ele fumava com o ocre das paredes envelhecidas. As almofadas encardidas e de uma fazenda de estampa escura completavam o aspecto lúgubre. Mas no centro, pendurada na maior parede, tinha uma grande foto dela, a sua musa, talvez a imagem que ainda o mantesse vivo: Elis.


Eu, por um momento, me arrependi de ter entrado no recinto e estava reavaliando se ainda deveria estar ali, parada, com uma expressão de espanto. Mas esse meu pensamento foi lento, muito lento. Rico me surpreendeu com um cumprimento, sem que eu nem notasse que ele se aproximara.


A sua imagem combinava com o resto do cenário. Nada mais coerente. Não era alto, e certamente estava subnutrido. As olheira profundas e os dentes escurecidos faziam contraste com o cabelo comprido e descolorido. Sinceramente, amedrontador. Mas ele foi gentil. É claro que gentileza não é o suficiente nessas horas, mas eu estava tão atônita e sem acreditar que estava imersa naquela situação, que andei pela sala em movimentos robóticos; e obedecendo a indicação do Rico, sentei-me na cadeira preta.


Quanto arrependimento. O leitor deve estar dizendo um "bem feito" pra mim. Depois e toda esta descrição, somente alguém com alguns parafusos a menos sentaria naquela cadeira e deixaria as próprias madeixas a mercê de um sujeito e num lugar como esse. Eu queria uma escova. Uma simples escova. Mas ao final dos 45 minutos mais longos e literalmente dolorosos da minha vida, eu saí pronta para ser confundida com um leão na rua. E Rico não me cobrou barato, o atrevido!!


Saí do salão (se é que pode-se chamar aquilo de salão) bufando. Não sabia medir se sentia maior raiva daquele que me indicou o lugar (melhor dizendo, daqueles. Impressionantemente, mais de uma pessoa me indicou a espelunca. Diziam que era feinho, mas que os resultados valiam a pena) ou de mim mesma, que após todos os mais claros sinais, prossegui.


Depois dessa experiência traumática, fiquei dias tentando evitar a lembrança deste dia. Somente depois de semanas, é que eu pude separar um pouco o Rico - torturador do Rico - ser humano. Ele só falava nela. Seus olhos brilhavam ao lembrar-se de sua beleza, de sua voz e um sorriso se esboçava toda vez que mencionava como Elis era cheia de vontades, temperamental.


Alguns meses depois, soube que Rico morreu. Assassinado. E então eu senti uma tristeza imensa. Primeiro, não entendi essa minha tristeza, se eu o havia odiado tanto. Mas depois entendi. Morreu ali alguém sem esperança, sem estímulo, sem horizontes. Morreu no anonimato, sozinho.


E eu passei pela vida desse homem, percebi toda a tragédia e não fiz nada a respeito. Saí com raiva e prometi a mim mesma que jamais voltaria a vê-lo. E de fato, não verei. O tempo já passou e lembrar dessa experiência em nada adianta. Mas me fez refletir sobre meus impulsos, minhas reações. Talvez eu pudesse ter falado mais, talvez eu pudesse ignorar o fato de que ele podia ser tudo, menos cabelereiro. Talvez eu pudesse ter alegrado aquele dia, mesmo que a tristeza voltasse a noite.


Talvez...

2.8.09

sopra o vento do norte

já dizia vianne, em chocolat:  "quando sopra o vento do norte, é hora de partir". dentro de 3 horas, de volta para o brasil. bagagens intermináveis, memórias preciosas e saudade, muita saudade ...

duo


mensagem musical de sexta a noite no mission institute.

31.7.09

aquisições.



Duas novas aquisições. Raridades. Fiquei bem feliz, especialmente, com o cd de Chopin, pois tem a gravação do Scherzo n. 4, que é frequentemente tocado pelo Nelson em seus recitais, mas como esse cd não tem o selo da sua atual gravadora, é pouco divulgado atualmente. Baratíssimos. O cd de piano duo contém o repertório do recital que a martha e o nelson darão na Roque d'Antheron no próximo dia 5. I highly recommend....sei que sou meio suspeita, mas mesmo assim, só estou compartilhando a alegria!

29.7.09

# 1

meu primeiro post, e justamente nele, que eh tao importante, estou num computador gringo, sem conseguir ajustar as devidas correcoes ortograficas. nada de acentos, nem cedilhas. e ja que ta tudo errado mesmo, aboli as letras maiusculas e o conceito de paragrafo. nao sei ainda arrumar o blog da maneira como gostaria, mas valha-me! isso vira com o tempo. acabo de sair de uma aula de 6 horas de duracao. curso de missioes e em ingles, conhecido como mission instutute. pessoas de diferentes lugares do mundo, diferentes culturas e um so proposito. as aulas tem o intuito de ajudar a amenizar essas diferencas culturais uma vez que o fato de ser estar no campo missionario, por si so, ja eh desafio suficiente. soma-se isso as dispariedades culturais e, por vezes, a falta de tato dos que inocentemente se dispoe para o trabalho, e os resultados sao cicatrizes indesejadas. tres sao os mestres (ja serviram como missionarios por varios anos) e eles nos expoe a possiveis situacoes futuras. eh interessante parar e pensar no que esta por vir. porque quando nos deparamos com o novo, pensamos no que eh empolgante e estimulante, e tambem temos a palida consciencia das dificuldades. mas raramente gastamos tempo refletindo nelas, e realmente procurando ter solucoes antes mesmo que elas acontecam. estou cansada. o dia foi produtivo dentro da sala de aula, mas o sol desse verao frio na andrews parecia me convidar a todo instante. comecei a pensar em tudo o que estes missionarios estao deixando para tras. pensei em mim, e na recente despedida dolorosa que sofri. distancia eh ruim. e todos os 50 alunos daquela sala se submetem a ela, por um ideal ilimitadamente mais nobre. sera que eu conseguiria? nao sei, nao sei. talvez sim. isso exigiria mais tempo de reflexao. volto a pensar nas minhas saudades atuais....e nao chego a nenhuma conclusao. apenas acho que ja eh hora de acabar este primeiro escrito. se alguma solucao me assolar, eu volto.